O fluxointernacional de comércio, do capital financeiro e comunicações acentuaram-senos últimos anos como jamais na história do mundo, afirmando, grandespesquisadores, que hoje vivemos a era da globalização ou mundialização
No que tangeao direito do consumidor, trata-se de direito fundamental de segunda geração, epoucos são os países que lhe conferem a real importância, inserindo em suasConstituições Federais princípios pétreos destinados à proteção daquele.
No MERCOSULnão há norma comum, quiçá foi iniciado o processo de harmonização das regrasnacionais sobre consumo, o que vem gerando conflitos de interesses.
O presentetrabalho cuidará de apresentar um paralelo entre legislações de proteção aosdireitos do consumidor
Considerandoque a realidade sócio-econômica dos Países Membros do Mercosul são distintas, eque excluem-se da tutela do Poder Judicante as relações de consumodesenvolvidas no âmbito da economia informal
A atividadecomercial é uma das antigas do mundo, ou seja, há produção e comercialização e,decorrência lógica é o consumo dos bens e serviços.
No entanto, apreocupação com as relações de consumo no mundo é algo novo, iniciou-se nadécada de 40. Observa Finatti que as normas específicas de tutela dos direitosdo consumidor tem origem recente, na década de 60, “que começaram a serproduzidas nos Estados Unidos da América, Israel, Japão, Inglaterra, Suécia,Noruega, Dinamarca, Finlândia, Alemanha, Bélgica, França, México, Portugal eEspanha”
Se aintegração econômica prescinde de regras, no mínimo harmônicas pararegulamentar as relações de consumo no espaço integrado, no âmbito mundial aRodada Uruguai do GATT não cuidou, diretamente das questões relativas àsrelações de consumo, mas, indiretamente, através do Trade Related Aspectos of Intellectual Property Rights (
O mesmoinstrumento de “pressão” capaz de reunir os governos para dispor sobre asregras do comércio internacional a fim de afastar o fantasma da “deslealdade”no curso do jogo, também foiutilizado em grande medida para instituir a proteção ao direito do consumidor.Mas agora, para excluir da concorrência aqueles que não reuniam em suasmercadorias “qualidade” e “eficiência” suficientes para atender às exigênciasdo consumidor. Tal assertiva encontra eco no fato de a sociedade civil não terse engajado para exigir do governo uma codificação capaz de estabelecer umequilíbrio nas relações de consumo
A origemconstitucional da lei brasileira está prevista no inciso XXXII, art. 5º e art.170 da Constituição Federal do Brasil, como princípio orientador dos direitosfundamental e econômico. Por talmotivo, sua posição hierárquica prescinde na hipótese de conflito com as regrasinternacionais [9].
Ainda, comonorma de caráter de ordem pública, a Lei de Proteção aos Direitos do Consumidorveio para estabelecer parâmetros de respeito e equilíbrio entre o consumidor,parte hipossuficiente
Na Argentina,a Constituição Federal previu, no art. 42, os direitos do consumidor, fixandoregras básicas a fundamentar a Ley de Defensa do Consumidor.
Também oParaguai relevou os direitos do consumidor na Constituição Federal, arts. 27,38 e 72, reconhecendo sua fragilidade e conferindo-lhe tratamento diferenciado.
Por fim, oUruguai prevê, em sua Constituição Federal, arts. 24, 44 e 52, regras mínimas sobreas relações de consumo, envolvendo cidadão(s) e coletividade.
No entanto, aConstituição Federal, enquanto norma de organização política de um Estado, bemcomo de reconhecimento e segurança de direitos fundamentais de ordem pessoal esocial, não possui o condão de regulamentar a proteção das relações de consumo,o que é tarefa da legislação infra-constitucional.
Esta, por suavez, possui especificidades que pode variar de um país para outro face àsdiferenças sócio-culturais. Por isso, ela não tem o condão de dirimir osconflitos advindos das relações de consumo estabelecidas em países distintos.Nesse sentido, observa Finatti, com propriedade que, “em nome dainterdependência, as desigualdades baseadas nas diferentes riquesas dos povossão acentuadas. Por essa razão, os ‘meridionais’ devem encetar iniciativas paradiminuir os desníveis inter-hemisféricos. As iniciativas de integração regionalnão surtirão os efeitos desejados (de fazer frente aos mega-mercadossetentrionais) se não forem acompanhadas de um conjunto de medidas de caráterpolítico e diplomático, planejadas preferentemente de forma concertada entre ospaíses ‘meridionais”
De qualquerforma e sem estabelecer juízo de valor no que tange aos elementos que motivarama promulgação do Código de Proteção e Defesa do Consumidor no Brasil (Lei nº8.070/90), e da Ley de Defensa del Consumidor na Argentina (Lei nº 24.240/93),cabe dizer que as leis advieram em muito boa hora, já que a abertura do mercadono início da década de 90 permitiu às nações sul americana a convivência comtodos os tipos e qualidades de mercadorias procedentes de vários países domundo.
No Brasil aLei nº 8.070/90 prevê os direitos básicos do consumidor (art. 6º), bem como umasérie de medidas protetivas das relações de consumo, inclusive aresponsabilidade civil, por danos moral e material, bem como penal pelos danoscausados ao consumidor. A par desta lei, outros órgãos públicos editaram normasque prevêem a proteção do consumidor, como o Banco Central do Brasil e asAgências Reguladoras. Trata-se de lei avançada e que prescinde o direito doeconomicamente mais forte em detrimento do hipossuficiente.
Trata-se denorma de ordem pública, de interesse social, e considerada, equivocamente, delei intervencionista. Fato é que desde que foi sancionada o
A Lei deProteção Defesa do Consumidor vislumbra, na seção II, que a indenização caberá,além dos casos de vício oculto, aos vícios de quantidade e qualidade, paratanto, dilatando os prazos para a reclamação para 30 dias, no caso de bens eserviços não duráveis e 90 para bens e serviços duráveis.
A Ley nº24.240/93 prevê a garantia de não menos que 6 meses da entrega do produto, e nocaso de serviços, a garantia deverá estar estipulada em contrato. Em ocorrendoa omissão, o prazo é de 30 dias seguintes ao término do serviço.
Destarte,somente os arts. 8º a 28 da Lei nº 8.078/90, expressam que são solidariamenteresponsáveis pelos prejuízos e danos causados aos consumidores, a cadeia deprodução, circulação, distribuição e comercialização de bens e serviços. Asobrigações decorrentes da culpa/dolo poderão ser desde a obrigação de fazer oudar algo, a indenização, multa. Porém, a Ley 24.240/93 é omissa quanto àresponsabilidade pelo fato do produto. O art. 40 da mesma, referente aoassunto, foi vetado pelo Poder Executivo.
Outro pontointeressante é ressaltar que há previsão legal de crimes contra o consumidor naLei nº 8.078/90, dispondo, para os casos extremos, a pena privativa deliberdade. Tal dispositivo é oportuno se considerarmos a invasão diária deprodutos e serviços, por vezes sem o controle sanitário ou de metrologia, pondoem risco a sociedade como um todo. Ao contrário, a Ley nº 24.240/93 dispõe quehipótese de ocorrência de delito, o mesmo é remetido para as autoridadescompetentes, sendo que o Código de Processo Penal argentino é norma supletiva.Neste caso, o deslocamento de competência para tomada de medidas poderáaumentar os prejuízos do consumidor face à demora no trâmite.
Aresponsabilidade pelo vício, instituída pela lei brasileira, é consagrada comodever do produtor/fornecedor/prestador com base no princípio da segurança egarantia, prescindindo, portanto, da existência de vínculo contratual entre aspartes. Esta responsabilidade, prevista no Código de Defesa do Consumidor éobjetiva, e, portanto, decorrente da obrigação de resultado.
Tanto noBrasil como na Argentina, ao contrário do instituído pelo direito civil para oscasos de indenização, os Códigos de Defesas do Consumidor prescindiram a idéiada culpa, adotando a teoria do risco, e invertendo, portanto, o ônus da prova(arts. 12 e ss. da Lei nº 8.078/90 e art. 37 da Ley nº 24.240/93).
No Brasil, oconflito de interesses entre consumidor e comerciante deverá ser dirimido peloPoder Judiciário. Na Argentina, a Ley nº 24.240/93, prevê no art. 59, apossibilidade de eleição do foro arbitral. O Protocolo de Buenos Aires sobreJurisdição em Matéria Contratual soluciona o conflito entre as normas aoafastar, terminantemente, esta possibilidade.
Assim, noâmbito do Mercosul, os conflitos decorrentes da relação de consumo somentepoderão ser dirimidos perante a autoridade judiciária do local do consumidor,minimizando, desta feita, os ônus deste. Afasta-se, por consequência, aextraterritorialidade das legislações nacionais (Lei nº 8078/90 e Ley nº24.240/93).
Muito emboraa legislação de proteção aos direitos do consumidor no Brasil seja avançada, apopulação como um todo ainda não está consciente de seus direitos, e, portanto,a opinião pública é um frágil meio de pressão; as estruturas de amparo aoconsumidor são insuficientes, o que se agrava se considerarmos que os valoresnecessários são suprimidos pelas propagandas, não raro, sugestivas a um modelode vida “padrão internacional” (consumo em fastfoods, modos de vestir, agir, dentre outros), além de informaçõesjornalísticas por vezes serem tendenciosas aos interesses de determinadossegmentos, perdendo-se, dessa forma, a função social do meio de comunicação comocentro difusor da cultura e informações para o bem comum de uma nação.
O mesmoacontece na Argentina. A lei veio a contento para minimizar os riscos eprejuízos decorrentes de um “mercado globalizado”, mas os meios colocados àdisposição da sociedade ainda são insuficientes ao fim que se destina.
Ainda, valemencionar que os órgãos institucionais de defesa dos direitos do consumidorainda são em número inexpressivo se comparado com as necessidades. Citemos comoexemplo as dificuldades de consumidores, residentes em localidades distantesdos grandes centros urbanos, em haver a contraprestação de um serviço utilizadono âmbito da garantia; ou ainda, a morosidade com que se opera a aplicação datutela jurisdicional em favor do direito do consumidor, inibem as a crença dosconsumidores de que seus direitos são respeitados.
Oexercício da cidadania, ainda sem expressão nas sociedades civis do MERCOSUL,deve ser intensificado, afim de alcançar o equilíbrio nas relações de consumodesenvolvidas no âmbito regional.
III. O Protocolo de Santa Maria e os RegulamentosTécnicos de Rotulagem: um exercício para estabelecer regras de defesa eproteção às relações de consumo
O Tratado deAssunção não menciona, de forma clara e precisa, regras sobre a tutela dosdireitos e obrigações nas relações de consumo, conforme se verifica daexposição de motivos do Tratado de Assunção: “Os Estados Partes, considerandoque a ampliação das atuais dimensões de seus mercados nacionais, através daintegração, constitui condição fundamental para acelerar seus processos dedesenvolvimento econômico com justiça social (...)”.
Sem tocar nomérito da apropriada integração econômica do Cone Sul, parece-nos que asociedade civil, transposta para a figura do consumidor no processo ora emcurso, ainda não tem recebido a atenção que merece, pois sem o consumo não hárazão para a integração econômica.
Durante aXIII Reunião de Cúpula do Mercosul, Marilena Lazzarini informa que foi afastadaa discussão acerca de um padrão jurídico na esfera do direito do consumidor, oqual minimizaria, em grandes proporções, os direitos do consumidor brasileiro,uma vez que a Lei nº 8078/90 seria revogada. Ao invés disso, “será negociado umpadrão amplo que estimule uma legislação comum, mas que não venha a reduzir osdireitos já adquiridos”
Em22/11/1996, foi acordado entre os Estados Partes do MERCOSUL o Protocolo deSanta Maria sobre Jurisdição Internacional em Matéria de Relações de Consumo.Este documento cuidou apenas de apresentar definições, em anexo ao documentoprincipal, e determinar as jurisdições para a solução de controvérsiasenvolvendo relações de consumo.
OsEstados Partes passaram a largo de determinar da lei aplicável ao conflito, oque implica que esta será a do país escolhido pelo consumidor para buscar atutela de seu direito. Ainda, não há previsão da mediação ou arbitragem parasolução do conflito.
EsteProtocolo prevê a edição de um Regulamento Comum para Defesa do Consumidor doMERCOSUL, o qual está em discussão para elaboração.
Em dezembro de2000, os Presidentes dos Estados Partes publicaram a Declaração Presidencialdos Direitos Fundamentais dos Consumidores do MERCOSUL, documento em quemanifestaram o compromisso de harmonizar progressivamente as legislaçõesnacionais de defesa e proteção das relações de consumo, para tantocontemplando, em síntese, os seguintes direitos fundamentais: proteção da vida,saúde e do meio ambiente; o equilíbrio nas relações de consumo; produtos eserviços seguros; a prevenção e a reparação dos danos patrimoniais; a educaçãopara o consumo e informações claras e precisas sobre os produtos e serviços; aproteção contra as práticas e cláusulas abusivas, publicidade não permitida;métodos coercitivos e desleais; a facilitação do acesso aos órgãos judiciários,administrativos e meios alternativos para solução dos conflitos de interesses,individuais ou difusos.
Tratam-sede princípios elementares que constituem os direitos básicos do consumidor noBrasil, para quem a harmonização da norma não traria qualquer prejuízo.
Recentementeforam editados os Regulamentos Técnicos MERCOSUL para a Rotulagem de AlimentosEmbalados e para a Rotulagem Nutricional de Alimentos Embalados, Resoluções doGrupo Mercado Comum nºs 26/03 e 46/03.
De uma breveanálise destes documentos, verifica-se que as regras de rotulagem são aquelasprevistas no Código do Consumidor brasileiro, ou seja, é necessária aapresentação de todas as especificações do produto e data de validade, demaneira a preservas a vida e a saúde do consumidor.
Em síntese, considera-se que as normas esparsas do ConselhoMercado Comum e do Grupo Mercado Comum contribuem para elaboração de um Códigode Defesa do Consumidor do MERCOSUL, configurando um exercício nesta etapa doprocesso de integração econômica para obter a harmonização das respectivaslegislações nacionais, para após, editar aquele Regulamento Comum para Defesado Consumidor do MERCOSUL, este sim uma norma comunitária.
1.Sem dúvida alguma que as leis nacionais de proteção aos direitos do consumidorvieram a contento com as expectativas da sociedade civil, uma vez que aocorrência de práticas comerciais prejudiciais aumentou na mesma proporção comque aumentaram os fluxos de mercadorias/serviços.
2. Mas éurgente a harmonização das regras de defesa e de proteção das relações deconsumo capaz de tutelar os direitos do consumidor no ambiente integradoeconomicamente, configurando uma das condições sine qua non para alcançar o desenvolvimento econômico com justiçasocial.
3. Algunspesquisadores sugerem que a lei brasileira apresenta-se como uma barreira nãotarifária ao comércio regional, típica dos Estados intervencionistas, o que éum equívoco, pois que suas regras efetivamente protegem o consumidor e, porconseqüência, educa os setores produtivos para que respeitem os consumidores,seja na melhoria do nível de qualidade, seja na lealdade da competição, seja naclareza que deve prevalecer nas relações de qualquer espécie, principalmente deconsumo.
4. Seria umparadoxo face à economia tal afirmação não tivéssemos como ponto de referênciao próprio cidadão, enquanto consumidor e enquanto integrante de um povo, comoprincípio e fim de todos os esforços colimados ao estabelecimento de um mercadocomum. Cidadãos que merecem respeito e consideração.
5. Vale mencionaro exemplo da União Européia
6. Por fim, aoferta de mercadorias na região integrada aumentou substancialmente, e,conseqüentemente, as mudanças nos hábitos de consumo.
Muito emboraa velocidade destas transformações seja maior do que a capacidade decompreensão por parte da maioria da população, sem perder mais tempo osconsumidores têm: i) de se conscientizar de seus direitos estabelecidos naslegislações nacionais, exigindo seu cumprimento; ii) de reclamar os abusoscontra eles praticados, buscando a efetiva tutela dos órgãos de defesa; iv) dearticularem-se e participarem ativamente na construção das regras que deverãonortear as relações de consumo no MERCOSUL.
Bibliografia
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FINATTI, MauroAndré Mendes, “A difícil implementação do direito do consumidor no Mercosul:balanço e prognósticos”, em RDC, vol.20, out/dez/96, SP.
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